Thursday, August 31, 2006

“E o pior é que é”

Seu Zé era uma homem cético, pelo menos ao meu ver com relação a eventos da natureza. Sabia colocar tijolos sobre tijolos em construções mirabolantes e o fazia sempre com muito esmero. Era nordestino do “interior brabo”, mal levantava a cabeça, mal se pronunciava. Pra ele tudo estava sempre bom. Tinha belas filhas e uma esposa meio “avexada”. Numa das vezes em que houve um eclipse lunar ele estava passando uns dias conosco. Eu lhe disse que naquele dia, ou melhor, naquela noite a lua iria sumir através do efeito do eclipse. Primeiro tive que explicar-lhe de maneira científica e prolixa o significado desse evento. Depois quis convencê-lo de que de fato iria ocorrer. Não acreditou. Não sei se por falta de compreensão, por ser cético, ou por pirraça mesmo. Disse-me que queria ver com os próprios olhos. A noite foi passando e eu e seu Zé aguardávamos na varanda de casa aquele momento “mágico”. O que eu achava mais engraçado era que ele olhava pro céu como se estivesse aguardando a volta do Messias ou o fim do mundo, tal era a expectativa e desconfiança que se misturavam em seu olhar. Por mais que eu tentasse convencê-lo de que aquilo se tratava apenas de um acontecimento natural, para ele seria no mínimo sobrenatural.
O tempo foi passando e nada da lua sumir. Seu Zé olhava pra lua, olhava pra mim. Olhava pra mim, olhava pra lua e, fazendo cara de “esse menino quer me enrolar”, aguardava pacientemente o momento em que eu dissesse que tudo aquilo era uma brincadeira. Mas não tardou muito e a lua começou ser “comida”, conforme expressão por ele mesmo usada. Em alguns minutos a lua sumiu e seu Zé, não dispensando sua frase típica, pronunciou: “E o pior é que é!”. Eu, sinceramente, esperava de sua parte uma reação mais entusiasmada acompanhada de palavras novas... Mas, nas verdade, não foram as palavras que falaram, foi a cara de bobo de seu Zé olhando pro céu, agora menos descrente da mágica dos astros e do cosmo. Espalitava os dentes sentado num tamborete e sussurrava: “E o pior é que é””. Gostávamos dele pela simplicidade de sua pessoa. Era um homem pacífico e trabalhador. Sempre de bem com a vida. Foi ele quem construiu nossa casa em Caruaru.
A seu Zé, dedico essa lembrança.

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